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13/08/2020
O cultivo superprecoce de feijão é a mais importante inovação do melhoramento genético dessa cultura no Brasil. Pesquisadores e produtores comprovaram que a prática promove elevado potencial produtivo, baixo custo de cultivo, resistência a doenças, boa qualidade de grãos e bom desempenho nutricional. Dois anos depois do lançamento da primeira variedade superprecoce desenvolvida no País pela Embrapa Arroz e Feijão (GO), a BRS FC104, produtores começam a anunciar bons resultados de produtividade (média de 3.792 kg/ha) em um ciclo de 65 dias, bem menor do que o de 90 dias, necessário ao plantio do feijão convencional.
“A Embrapa acertou com essa cultivar,” comemora o produtor Kenes Pereira, de Santa Helena de Goiás, que utilizou o feijão carioca BRS FC104 e conseguiu colher 50 sacos por hectare, a um custo estimado de R$ 3 mil reais. Levando em conta o bom momento do preço do feijão no mercado no primeiro semestre de 2020, o lucro foi compensador.
Segundo o pesquisador da Embrapa Leonardo Melo, o resultado comprova as expectativas da Empresa, que há quatro décadas investe em pesquisas genéticas para gerar variedades melhoradas de feijoeiro-comum com redução no tempo de cultivo. “Os esforços nessa área resultaram na BRS FC104, em 2018, considerada uma das maiores conquistas do melhoramento genético de feijão no Brasil”, destaca.
Melo acrescenta que a precocidade permite rápido retorno do capital investido e maior flexibilidade no manejo dos sistemas de produção, economia de água e energia elétrica nos sistemas irrigados, além de atenuar problemas com pragas e estresse hídrico pelo planejamento antecipado. “Por isso, é uma característica cada vez mais valorizada no agronegócio do feijão”, pontua.
Os experimentos iniciais tiveram como base materiais de grãos de origem andina, que têm a precocidade por característica natural, variando de 70 até 80 dias, ciclos normalmente mais curtos que os grãos de origem mesoamericana. Na década de 1980, a Embrapa Arroz e Feijão lançou a cultivar Jalo Precoce, a primeira com uma redução importante no tempo de cultivo, de 70 a 75 dias. Em 2002, foi desenvolvida a BRS Radiante (foto acima), cultivar do tipo rajado, precoce (80 dias, da emergência à maturação) e com potencial para exportação. Assim, se consolidou a eficiência da pesquisa sobre o tema.
Melo lembra que o desenvolvimento dessas duas cultivares foi um grande passo no trabalho, mas elas ainda eram materiais de grãos especiais, cujo mercado apesar de consolidado, ainda é pequeno no Brasil. Segundo o Plano Nacional de Desenvolvimento da Cadeia do Feijão, publicado em 2018 pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), o consumo anual per capita do brasileiro chega a 17 quilos.
produzindo, em média, cerca de 3,1 milhões de toneladas. Os grãos de feijão carioca se destacam, representando 70% desses números. Esse cenário orientou a pesquisa a desenvolver cultivares desse tipo comercial, visando a satisfazer às exigências do setor produtivo.
A primeira cultivar de origem mesoamericana, grão menor, desenvolvida no Brasil com redução do tempo de cultivo foi a BRS Campeiro , do tipo preto, muito produtiva e com 80 dias de ciclo. Em 2005, com o lançamento pela Embrapa da BRS Cometa, teve início a era das cultivares do tipo carioca de ciclo reduzido. Devido ao grão um pouco escuro, apesar de diversas qualidades positivas, ainda apresentava certa rejeição do mercado.
A BRS Cometa não foi muito adotada, mas abriu caminhos para cultivares carioca, que agradam mais ao mercado. Logo depois, veio a BRS Notável, que corrigiu defeitos da BRS Cometa, aumentando a produtividade e a resistência a doenças, mas ainda tinha o mesmo problema da coloração escura, pouco comercial no mercado convencional, mas uma boa opção em nichos alternativos relacionados à agricultura familiar e orgânica.
“Foi uma cultivar muito utilizada em cultivo agroecológico, agricultura familiar, nos quais não se dá tanta importância à coloração do grão, já que a qualidade culinária é a mesma. Além de muito produtiva, é a mais resistente a doenças já desenvolvida até hoje pela Embrapa. Apresentando resistência a antracnose, crestamento, murcha de curtubaterium e fusárium”, pontua o pesquisador.
Até o lançamento da BRS FC104 (foto à direita), primeira cultivar superprecoce do mercado, todas as cultivares desenvolvidas eram de ciclo precoce ou semiprecoce. A superprecocidade representou um salto quantitativo e qualitativo na gestão da safra de feijão pelos benefícios competitivos que apresenta, como o elevado potencial produtivo (produtividade de 60 kg de grãos, em média, para cada dia de ciclo) e redução de cerca de 30% dos custos com eletricidade e água no cultivo. Possui ainda características que garantem a boa aceitação do mercado, como resistência a doenças, qualidade de grãos e valores nutricionais.
O pesquisador destaca também que devido ao ciclo reduzido, a tendência é que se faça menos pulverizações com defensivos. “No período em que ocorre o pico de ocorrência dos insetos e de doenças, o produtor já terá feito a colheita”, afirma. Esse fator aumenta a qualidade do produto, pois reduz a possibilidade de ocorrência de resíduos químicos, além de diminuir o impacto no meio ambiente.
Outra oportunidade oferecida pela superprecocidade é realizar o plantio em um momento no qual uma cultivar de ciclo normal traria risco de encontrar seca no fim da safra. Um exemplo é o plantio da safrinha no Mato Grosso, onde se utiliza como opção o feijão-caupi, mais tolerante à seca, quando se colhe a cultura de verão a partir do fim de fevereiro. “No caso do feijão superprecoce, em algumas regiões, é possível plantar o feijão comum até 15 de março, porque ele é colhido 30 dias mais cedo. Portanto, o risco de seca é menor”, diz Melo.
O mesmo ocorre na safra de inverno, na qual não seria possível prorrogar muito o plantio com uma cultivar de ciclo comum, devido à grande probabilidade de colheita na época da chuva e de desrespeitar o vazio sanitário. A cultivar superprecoce permite plantar até na segunda quinzena de julho, colhendo ainda na época adequada.
Os trabalhos estão caminhando para que, nos próximos três anos, seja lançado um feijão preto superprecoce, selecionado dentro do BRS FC104. Durante a pesquisa, ele apresentou uma planta de grãos pretos, que foi selecionada, e os grãos multiplicados. “Foi possível identificar oito linhagens de grãos pretos superprecoces. Agora, em 2020, vamos iniciar um ensaio de Valor de Cultivo de Uso (VCU) para avaliar esta semente em condições diversas, no Brasil inteiro”, revela Melo.
Em 2021, a Embrapa espera lançar uma nova cultivar precoce, a BRS FC310, na qual foi corrigido o problema do grão escuro. “Ela tem grão muito claro, além de potencial para ser a cultivar precoce mais utilizada na agricultura empresarial”, finaliza o pesquisador.
Fonte: Embrapa Arroz e Feijão