A Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, por meio do Instituto de Pesca (IP-APTA), realiza na Unidade de Pesquisa e Desenvolvimento de Pirassununga diversas pesquisas técnico-científicas voltadas a diferentes espécies de organismos aquáticos. Dentre estas, estão aquelas ligadas à carcinicultura (criação comercial de camarões), com destaque para as espécies de água doce, popularmente chamadas de "pitus". Além dos projetos de pesquisa, os pesquisadores e técnicos da UPD ministram cursos com foco no atendimento ao público em busca de informações sobre o tema, geralmente com o intuito de entrar profissionalmente na atividade.
"Somos frequentemente procurados por produtores rurais interessados em criação de camarões em águas interiores, ou seja, em áreas distantes do litoral. Entretanto, notamos que boa parte dessas pessoas não sabe que a grande maioria das criações no interior do país são realizadas com uma espécie de água doce", conta Marcello Boock, pesquisador do IP na UPD Pirassununga. A espécie, Macrobrachium rosenbergii, conhecida como camarão-da-Malásia, ou gigante-da-Malásia, é muito difundida mundialmente e corresponde à principal espécie de camarão de água doce (CAD) criada comercialmente no Brasil, segundo o pesquisador. "Por outro lado", lembra Boock, "há também aqueles que acreditam que todos os camarões criados em águas interiores são exclusivamente espécies de água doce, o que não é verdade, pois atualmente já existe tecnologia para produção de camarões marinhos, em água de baixa salinidade, no interior".
No IP, a equipe formada, além de Boock, pelos pesquisadores Helcio Marques e Márcia Galvão, em parceria com o pesquisador Sérgio Schalch, do Polo Regional Vale do Paraíba da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA), tem atuado em diversas linhas de pesquisa com a carcinicultura de água doce. Entre as mais inovadoras, Boock cita a rizicarcinicultura, que é a criação de camarões de água doce em campos de arroz irrigado por inundação; o cultivo integrado com peixes (policultivos); e a criação em sistemas "pellet free" (sem ração) e em sistema orgânico. "Também desenvolvemos trabalhos com sistemas alternativos de produção de larvas de camarão (larvicultura) e produção de espécies nativas de camarões como isca-viva para pesca esportiva", acrescenta o especialista.
Boa opção para o pequeno produtor
De acordo com o pesquisador do IP, no Brasil o cultivo do camarão-da-Malásia é uma boa alternativa para o produtor que deseja ingressar na atividade da carcinicultura fora da região litorânea. "Os camarões de água doce geralmente são criados por pequenos e médios produtores, na maioria das vezes não constituindo a sua principal atividade econômica", comenta Boock. Esses pequenos criadores, segundo ele, normalmente utilizam mão de obra familiar e a atividade complementa a renda da propriedade rural. A produtividade média alcançada, utilizando-se sistema extensivo ou semi-intensivo, é de 1000 a 1500 quilos/hectare a cada ciclo de produção (que dura 6 meses). "Os investimentos e capital de giro nesses sistemas de produção são bem mais baixos quando comparados aos dos sistemas de produção de camarões marinhos", pontua o especialista. "Além disso, devido à criação em baixa densidade, os camarões de água doce praticamente não apresentam problemas de doenças e os efluentes produzidos na atividade são menos impactantes, podendo ainda serem criados com baixa taxa de renovação de água", complementa.
O pesquisador do IP comenta que, apesar de ser possível, do ponto de vista técnico, criar camarão marinho em águas interiores, mesmo longe do litoral, o alto custo de investimento inicial e capital de giro lançam dúvidas sobre a viabilidade econômica desse tipo de empreendimento em pequenas propriedades - o que pode significar mais despesas do que lucros para o produtor. "Muitas pessoas estão entrando nesta atividade sem ‘fazer contas’, influenciadas por ‘youtubers’ que só estão preocupados em vender seus cursos ou produtos", alerta.
Diferenças entre camarões de água doce e marinhos
Boock diz que existem muitas dúvidas a respeito das diferenças entre os camarões marinhos e de água doce comumente cultivados em águas brasileiras. Conforme elucida, duas espécies perfazem a quase totalidade da produção nacional: o camarão-da-Malásia e o camarão-branco-do-Pacífico (Litopenaeus vannamei). O primeiro é originário do sudeste asiático e passa a maior parte da vida em rios que desaguam no mar. Em cativeiro, é criado em água com salinidade zero. Já o camarão-branco-do-Pacífico, principal espécie de camarão marinho criado no Brasil, é encontrado no oceano que o nomeia e passa todo seu ciclo de vida em regiões com médias a altas salinidades, muito embora possa ser criado em água com baixa salinidade.
Uma diferença importante, segundo o pesquisador, é que os camarões de água doce geralmente são criados em baixas densidades de estocagem (100 mil pós-larvas/ha), principalmente devido ao seu comportamento territorialista e agressivo. Por outro lado, os camarões marinhos, pouco agressivos, podem ser criados em sistemas intensivos a super-intensivos, com densidades de estocagem acima de 200 mil juvenis/ha - característica que, apesar de permitir maior produtividade, pode levar ao aumento de doenças e maior emissão de efluentes.
Por fim, o pesquisador do IP esclarece uma das principais perguntas que recebe: em relação à carne de ambas as espécies, existem diferenças? "Embora a composição da carne de ambos seja muito semelhante em termos nutricionais, a ‘casca’ - o termo correto é exoesqueleto - dos camarões de água doce é mais espessa e, por isso, as formas de preparo de ambos diferem bastante", explica Boock. O especialista diz que para se preparar e consumir os camarões de água doce é necessário, na maioria das vezes, se retirar a "casca", enquanto os marinhos podem ser preparados e consumidos com ela. "Em termos de sabor, ambos são bastante semelhantes, com muitas pessoas se referindo à carne do camarão de água doce como sendo mais ‘suave e delicada’, enquanto a do marinho como tendo um sabor mais ‘forte e pronunciado’", detalha o pesquisador. "Embora esses conceitos de sabor sejam muito subjetivos, é certo que as estratégias de comercialização devem levar em conta todos esses fatores, para que o consumidor não se decepcione ao consumir uma espécie achando que está consumindo outra", finaliza.
Fonte: Secretaria da Agricultura do Estado de São Paulo
Fonte: Secretaria da Agricultura do Estado de São Paulo